Os homens têm medo das mulheres independentes?

Embora reafirmada por elas e presente no discurso masculino, a emancipação da mulher ainda assusta muitos homens
O psicanalista Ernesto Duvidovich, diretor do Centro de Estudos Psicanalíticos, explica que o medo dos homens é relativo, mas existe. “A mulher independente é uma ‘parente próxima’ de uma mulher dominadora, que compete com o parceiro – e às vezes ganha mais do que ele, por exemplo. Por isso, é comum encontrar homens que se sentem diminuídos diante delas”.
Financeiramente, Hamilton de Paula, 38 anos, acha que a mulher tem que ser independente, mas isso não pode valer para tudo. “O homem quer se sentir necessário na vida dela. Acredito que isso faz parte de um relacionamento sadio: o homem proteger, manter a segurança familiar, ser um pilar importante e não mais um membro. Ela, por sua vez, tem que assumir o papel de mãe, que é insubstituível.”
Mas, hoje, é comum a mulher assumir outro papel. “Um século atrás, a mulher era completamente dependente. Hoje, muitas são chefes de família. Essa mudança, que ocorreu com o movimento feminista, também atrapalhou as relações”, diz Ernesto, que explica que, apesar disso, não significa que a emancipação feminina seja um fenômeno negativo. “É uma profunda melhora comparada à escravidão anterior, mas gera novos conflitos. O homem não tem mais a posição de antes e isso assusta”.
Coisa do passadoA escritora Stella Florence, autora especialista em relacionamentos – que lançou recentemente “32 – 32 anos, 32 homens, 32 tatuagens” (Ed. Rocco, 2009) –, não considera compreensível um homem sentir esse tipo de receio. “Acho que apenas os homens inseguros têm medo de mulheres independentes – os homens que confiam no seu taco nem se abalam”, diz ela, que ainda desafia: “a questão é: vale a pena se abalar por alguém que não confia no próprio taco?”
José Carlos de Almeida, 29 anos, afirma com veemência que, para ele, esse receio não existe. “Definitivamente, não. Um relacionamento precisa ser baseado em uma parceria. É coisa do passado dizer que a mulher precisa depender do homem para que ele se sinta necessário. Acho que o problema que a maioria tem, hoje em dia, é precisar de mais argumentos do que antes para manter uma mulher em casa”.
E é verdade: no passado, bastava ser responsável pelo sustento da família. E só. “Agora, sim, tem que manter aceso o sentimento, o respeito, a parceria”, lista José Carlos, que não reclama disso e diz gostar das independentes, o que para ele é até um atrativo sexual extra. O psicanalista Ernesto confirma. “As fantasias sexuais são singulares. E tem homens que se sentem atraídos pelas mulheres independentes”.
Mesmo assim, no geral, ainda há a dificuldade de aceitar a emancipação feminina. “Esse fenômeno está produzindo transformações enormes. E vai ter mais. Isso está intimamente vinculado aos fins de casamentos”, diz Ernesto. “As mudanças ocorrem, inclusive, em relação ao modo como se encara a sexualidade – hoje é normal a mulher ter muitos parceiros, não tendo que se submeter mais a um só homem para a vida inteira”.
Nascidos para cuidarO psicoterapeuta Oswaldo Rodrigues Junior, diretor do Instituto Paulista de Sexualidade, explica que os homens normalmente são socialmente criados, nas duas primeiras décadas de vida, para ser um “cuidador”, alguém que vai encontrar uma mulher que precisará dele e será submissa. “Assim, a maioria dos homens espera uma mulher que não seja superior. Mesmo numa época em que o discurso de igualdade está incorporado ao cotidiano masculino, eles só sabem relacionar-se com mulheres que fiquem um degrau abaixo”.
A mulher independente financeira e socialmente trará receios para o homem, que sente que ela não precisa dele para cuidá-la. “Ela coloca em dúvida a capacidade masculina de cuidar da mulher”, diz Oswaldo, que alerta ainda para o outro lado da moeda: “Mas há muitas mulheres independentes que não suportam um homem que não as cuide, exigindo um padrão mais alto que o que elas alcançaram”.
E, ainda, há os homens que gostam apenas do lado bom da independência financeira: quer que a mulher trabalhe, ajude nas despesas, mas se recusa a compartilhar afazeres domésticos, por exemplo. “É conflituoso”, diz Ernesto. “Isso coloca a mulher numa posição complicada. Por um lado, ele quer uma coisa, por outro, quer outra. A mulher tem a chamada dupla jornada”.
O especialista encerra lembrando uma questão que ainda não dá para responder, e arrisca um palpite: “As transformações com o avanço da mulher ainda não acabaram, mas estão acontecendo rapidamente. É difícil prever como serão as relações e o que vai acontecer no futuro, mas é provável que elas sejam cada vez mais independentes, as pessoas morem cada vez mais sozinhas e abram mão dos filhos”.

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